Poema

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Sobre o autor

Mário de Sá-Carneiro nasceu em Lisboa, em 1890, em uma família rica e militar. Órfão de mãe aos dois anos, foi criado pelos avós. Começou a escrever poesia aos 12 anos e traduziu autores como Victor Hugo e Goethe na adolescência. Estudou Direito em Coimbra, mas abandonou o curso e foi para Paris, onde levou uma vida boêmia, afastando-se dos estudos. Em 1912, tornou-se amigo de Fernando Pessoa, com quem fundou a revista modernista "Orpheu", marco do Modernismo em Portugal. Sua obra é marcada por intensa angústia, refletida em sua correspondência com Pessoa. Em 1916, com apenas 25 anos, suicidou-se em Paris, após um período de grande desespero. Seu legado literário cresceu após sua morte, sendo hoje considerado um dos maiores expoentes da literatura moderna portuguesa. Poemas seus foram musicados e homenagens foram prestadas em Portugal, incluindo a nomeação de ruas e escolas. Influenciado por Edgar Allan Poe, Baudelaire, e outros, Sá-Carneiro também influenciou escritores como Eugénio de Andrade.

Música

Nada me expira já, nada me vive ---
Nem a tristeza nem as horas belas.
De as não ter e de nunca vir a tê-las,
Fartam-me até as coisas que não tive.
Como eu quisera, enfim de alma esquecida,
Dormir em paz num leito de hospital...
Cansei dentro de mim, cansei a vida
De tanto a divagar em luz irreal.
Outrora imaginei escalar os céus
À força de ambição e nostalgia,

E doente-de-Novo, fui-me Deus
No grande rastro fulvo que me ardia.
Parti. Mas logo regressei à dor,
Pois tudo me ruiu... Tudo era igual:
A quimera, cingida, era real,
A própria maravilha tinha cor!
Ecoando-me em silêncio, a noite escura
Baixou-me assim na queda sem remédio;
Eu próprio me traguei na profundura,
Me sequei todo, endureci de tédio.

E só me resta hoje uma alegria:
É que, de tão iguais e tão vazios,
Os instantes me esvoam dia a dia
Cada vez mais velozes, mais esguios...

Vídeo da música